Veja outros textos inspiradores!
Os Três Mal-Amados O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço. O amor comeu meus cartões de visita. O amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome. O amor comeu minhas roupas, meus lenços, minhas camisas. O amor comeu metros e metros de gravatas. O amor comeu a medida de meus ternos, o número de meus sapatos, o tamanho de meus chapéus. O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos e de meus cabelos. O amor comeu meus remédios, minhas receitas médicas, minhas dietas. Comeu minhas aspirinas, minhas ondas-curtas, meus raios-X. Comeu meus testes mentais, meus exames de urina. O amor comeu na estante todos os meus livros de poesia. Comeu em meus livros de prosa as citações em verso. Comeu no dicionário as palavras que poderiam se juntar em versos. Faminto, o amor devorou os utensílios de meu uso: pente, navalha, escovas, tesouras de unhas, canivete. Faminto ainda, o amor devorou o uso de meus utensílios: meus banhos frios, a ópera cantada no banheiro, o aquecedor de água de fogo morto mas que parecia uma usina. O amor comeu as frutas postas sobre a mesa. Bebeu a água dos copos e das quartinhas. Comeu o pão de propósito escondido. Bebeu as lágrimas dos olhos que, ninguém o sabia, estavam cheios de água. O amor voltou para comer os papéis onde irrefletidamente eu tornara a escrever meu nome. O amor roeu minha infância, de dedos sujos de tinta, cabelo caindo nos olhos, botinas nunca engraxadas. O amor roeu o menino esquivo, sempre nos cantos, e que riscava os livros, mordia o lápis, andava na rua chutando pedras. Roeu as conversas, junto à bomba de gasolina do largo, com os primos que tudo sabiam sobre passarinhos, sobre uma mulher, sobre marcas de automóvel. O amor comeu meu Estado e minha cidade. Drenou a água morta dos mangues, aboliu a maré. Comeu os mangues crespos e de folhas duras, comeu o verde ácido das plantas de cana cobrindo os morros regulares, cortados pelas barreiras vermelhas, pelo trenzinho preto, pelas chaminés. Comeu o cheiro de cana cortada e o cheiro de maresia. Comeu até essas coisas de que eu desesperava por não saber falar delas em verso. O amor comeu até os dias ainda não anunciados nas folhinhas. Comeu os minutos de adiantamento de meu relógio, os anos que as linhas de minha mão asseguravam. Comeu o futuro grande atleta, o futuro grande poeta. Comeu as futuras viagens em volta da terra, as futuras estantes em volta da sala. O amor comeu minha paz e minha guerra. Meu dia e minha noite. Meu inverno e meu verão. Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte.
Por João Cabral de Melo NetoViva com orgulho. Se sua fraqueza o dominar, aqueça seu coração, cerre os dentes e siga em frente. Mesmo que sua covardia o retarde, não impedirá a passagem do tempo.
Por Kyojuro Rengoku - Demon Slayer - Kimetsu no YaibaComo uma sereia emergindo de um oceano de papel, a garota surgiu do outro lado da sala.
Por Brian SelznickÊxodo, EX, 35:17, as cortinas do átrio, as suas colunas, as suas bases e o cortinado da porta do átrio;
Por Êxodo, Antigo TestamentoRevelação Meu o ofício incerto das palavras a evocação do tempo o recurso ao fogo Meu o provisório olhar sobre este rio o fascínio consentido das margens sitiando a distância Meus são os dedos que em tumulto modelam capitéis de sombra e arestas Mas oculto na brisa és Tu quem percorre o poema despertando as aves e dando nome aos peixes
Por José Tolentino MendonçaEntra pra ver Mas tira o sapato pra entrar Cuidado que eu mudei de lugar Algumas certezas
Por Cícero Rosa LinsTEMPO EM SONETO Se tempo é a minha fortuna, quero ir além Ter quem, no essencial tempo para amar Tempo nas palavras pra falar com o olhar Tempo no tempo pra ter tempo, também... Porém, que este tempo traga um lugar Que se possa no tempo confiar a alguém Tempo ao tempo que esperança contém Criando tempo no meu vário caminhar Se tempo é tudo que tenho, me convém Aprecia-lo com tempo, assim, respeitar Cada tempo que o tempo no fado detém Então, no tempo eu ter afeto sem desdém E cada detalhe do tempo, o bem embalar Sem objeções e ofensas ao tempo... Amém! Luciano Spagnol Poeta do cerrado Janeiro de 2017 Cerrado goiano
Por Luciano Spagnol (poeta do cerrado)